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Lagoa Real: memória e fé dos vaqueiros do Sertão da Bahia
History zamanabrisa 1.6K 8th Apr, 2022
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Este e-book foi produzido com o apoio financeiro do Estado da Bahia através da
Secretaria de Cultura (Prêmio Cultura na Palma da Mão/PABB) via Lei Aldir Blanc,
redirecionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo
Federal.
Com este apoio financeiro foi possível, além da exposição de fotografias previstas no
pleito do edital, a pesquisa, a organização e a sistematização acerca dos festejos em
homenagem aos vaqueiros do sertão da Bahia, nomeadamente, os da cidade de Lagoa
Real, realizados anualmente há mais de 29 anos no evento conhecido como “Missa do
Vaqueiro”.
Assim, este e-book possui imagens e textos sistematizados sobre o vaqueiro encourado
sertanejo em suas práticas tradicionais compostas de elementos de identidade, memória
e referências culturais que influenciaram e contribuíram para a colonização e fixação de
colonos em terras mais distantes do litoral (da então província baiana) e do recôncavo
baiano.
De sesmaria em sesmaria, os vaqueiros foram os responsáveis por guiar o gado em
estradas (àquela época, desconhecidas) para a morada destes animais (no que depois
seriam as fazendas) e contribuiu para a fixação de colonos estimulados por interesses
diversos, dentre os quais, a fama de tesouros minerais e a possibilidade da exploração de
mão-de-obra a ser escravizada– dando início ao período das bandeiras baianas que
precedem as paulistas nas descobertas do sertão.
Desse modo, este e-book contribui para um elo silenciado ou, por que não?, pouco
estudado de maneira sistêmica no sentido de atribuir ao vaqueiro sertanejo a
importância no que começou o Tomé de Souza ao fazer chegar à província da Bahia as
primeiras cabeças de gado vacum e que, portanto, foi o gérmen do que seria o mais
significativo fenômeno sociocultural para a criação do Estado da Bahia, do Nordeste e
do Brasil com a “civilização dos currais”.
Boa leitura!
PREFÁCIO
A historiografia dos sertões da Bahia tem revelado, nos últimos anos, um amplo
repertório de vivências e experiências das sociedades sertanejas. Mesmo após vários
estudos publicados com base em pesquisas acadêmicas e outros pesquisadores e
interessados na cultura e histórias regionais, muito ainda se tem por revelar nesse vasto
e diversificado teatro, onde se forjaram ricas e preciosas culturas.
Nos sertões plurais da Bahia, onde pululam formas de existências sociais que
particularizam cada território, destaca-se o Alto sertão, ou sertões de cima, como
historicamente ficou registrado. Localizado na região sudoeste e tendo por vizinhos o
sertão da ressaca (planalto da Conquista), a chapada diamantina, o curso médio do rio
São Francisco e as fronteiras com o Norte de Minas Gerais, o Alto Sertão da Bahia que
tem a serra geral por espinha dorsal, entre serras, vales e baixios, onde caatinga e
cerrado cedem espaço, por vezes, para pequenas ocorrências de matas, produziu
singularidades preciosas.
Auto referenciado atualmente como território de identidade do sertão produtivo,
o território histórico do Alto sertão teve na pecuária disseminada por todo o vale do São
Francisco, desde o século XVII, o elemento fundante da ocupação de suas terras e
constituição de núcleos de povoamento. Associada à policultura, a assim denominada
“civilização do couro” também adquiriu contornos específicos nesse território, sendo a
criação de gado vacum um elemento, não apenas de fixação e organização social e
produtiva, mas um elo de conexão estratégico com outras regiões, com quem
estabeleceu escala de trocas que permitiu a consolidação da sociedade altosertaneja.
A atividade pecuarista em caráter extensiva, inicialmente, produziu relações entre
o trabalho livre ou semi servil de mestiços sertanejos que buscavam associação aos
grandes criadores, associado à presença escrava marcante, como condição para o maior
desenvolvimento de suas atividades e reprodução da riqueza social. Nas franjas dessas
relações, nasceu um tipo humano específico: o vaqueiro “encourado”, como se expressa
nesta obra que aqui se apresenta.
Misto de profissionais do trato cotidiano com as boiadas que serviam a grandes
senhores e pequenos criadores que, não tendo condições de contratar mão de obra
remunerada, assume a própria lida com o gado, os vaqueiros produziram recursos de
ação marcados pela destreza e trato do cavalo – fiel companheiro – pelo manejo no laço
e pelas vestimentas de couro, marcas expressivas de sua estética e identidade, que
também expressam a coragem e intrepidez no manejo das reses sob seu controle.
Em torno dessa figura desenvolveram um conjunto significativo de traços
culturais, desde o domínio de um canto - o aboio – que lembra muito (e quem sabe
guarde referências mais próximas) dos cantos árabes de lamento e oração. Não é difícil
considerar essa possibilidade, considerando a presença moura na Península Ibérica e sua
miscigenação na cultura portuguesa, uma das matrizes sociais dos sertanejos baianos.
As estratégias de ação da lida do vaqueiro, considerando os equipamentos de reserva de
água e alimentos, completam o repertório de marcas identitárias dessa profissão,
ocupação ou expressão identitária de uma categoria marcante da vida sertaneja.
Nesta obra intitulada: Lagoa Real: Memória e fé dos vaqueiros do Sertão da
Bahia, a autora Zamana Brisa, buscou as raízes históricas e sociológicas para
compreensão da figura do vaqueiro na vasta cultura dos diversos sertões nordestinos e
baianos, particularizando os expressivos vaqueiros “encourados” da cidade de Lagoa
Real. De antiga fazenda a distrito do município de Caetité, o jovem município de Lagoa
Real, desde sua emancipação em 1989, teve nas vivências dos vaqueiros uma das
formas mais expressivas de sua identidade, cuja memória é anualmente reatualizada
pela já famosa Festa do Vaqueiro.
O registro desta festa e de seus protagonistas, expressivamente marcados nesta
obra por um repertório de fotografias, é pautado pela Missa do Vaqueiro, pela
vaquejada e atrações musicais que celebram expressivamente essa cultura no Alto
Sertão da Bahia. Através de pesquisa feita com base em bibliografia clássica sobre o
tema, a autora nos brinda com informações preciosas e nos convida a conhecer ainda
melhor, as marcas de uma cultura e de um povo que, entre memória e tradição, procura
traçar seu presente e apontar rumos para um futuro tão distinto quanto seu passado.
Caetité, abril de 2022.
Zezito Rodrigues1
1
Professor de História do Brasil do Departamento de Ciências Humanas / DCH-VI / UNEB, doutor em história pela
Universidade Federal Fluminense – UFF. E-mail: zezito.uneb@gmail.com
Produção fotográfica
por Juh Leite2
“Nas nossas vidas diárias, devemos ver que não é a felicidade que nos faz agradecidos, mas a
gratidão é que nos faz felizes, e nessa mistura de gratidão e felicidade que quero expor minha
total alegria em participar deste projeto. Acredito que fotografar é a arte de eternizar momentos
e sou muito feliz em poder atuar com fotografia. Agradeço primeiramente a Deus e aos meus
guias espirituais pela sabedoria e vida. Agradeço ao apoio financeiro do Estado da Bahia
através da Secretaria de Cultura (Prêmio Cultura na Palma da Mão/PABB) via Lei Aldir Blanc,
redirecionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal
pela oportunidade. Minha gratidão a Zamana Brisa por ter me acompanhado na pesquisa e me
ajudado a contextualizar as imagens fotográficas por meio do texto deste livro. Agradeço ao
Museu do Alto Sertão da Bahia (MASB) nas pessoas de Poliana Gomes e Hilda Barbara.
Agradeço Associação da Memória e do Patrimônio Cultural (AMPC) pelo total apoio neste
projeto. Agradeço à Fotus K na pessoa de Adailton Carvalho, amigo de muitas caminhadas para
registrar celebrações culturais no sertão. Gratidão ao Cleber Eduão por emprestar versos que
cantam e encantam o nosso sertão. Gratidão a todos os professores, memorialistas e
historiadores que, de alguma forma, contribuíram e apoiaram no andamento deste projeto.
Agradeço imensamente a Margareth Castro e Antônio Castro pela oportunidade que me deram
em atuar com fotografia ao me dar a oportunidade de fazer parte da Revista Imagem de CaetitéBA. Por fim agradeço a todos os vaqueiros de Lagoa Real e região. Que esta cultura linda
continue permanecendo de gerações em gerações”.
2
Juscilene Leite possui experiências em atividades culturais e atua desde 2017, como fotógrafa, em desfiles de
carros de boi, festividades de padroeiros de Caetité e região, eventos em comunidades quilombolas, eventos em
homenagem aos Vaqueiros de Lagoa Real e região.
Produção textual
por Zamana Brisa3
“Cabocla sonhadora.
Falar do meu sertão aumenta a minha reza.
Eu não sou a dona do mundo.
Mas, tenho orgulho em ser filha do dono e ter muitos irmãos”.
3
Contribuiu na Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (SECULT) como coordenadora na Fundação Pedro
Calmon. Atuou na administração institucional e atividades do Programa de Educação Patrimonial (PEP) como
gestora no Museu do Alto Sertão da Bahia (MASB). Atuou no Programa de Comunicação Social (PCS) e
Programa de Educação Ambiental (PEA) da Força Eólica do Brasil/NEOERGIA. Contribuiu como Relações
Públicas na PETROBRAS com a Universidade Petrobras (UP). Graduada em Comunicação Social com ênfase em
Relações Públicas e Museóloga, mestra em Museologia pela UFba. Especialista em Educação e Gestão Ambiental
e em Gestão do Patrimônio Histórico-Cultural e Ambiental pela UNEB. Licenciada em Educação Infantil e séries
iniciais do Ensino Fundamental pelo Instituto de Anísio Teixeira (IEAT).
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